Soroban - Onde se originou o Soroban?
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[editar] Onde se originou o Soroban?
A sua origem se perde nos mantos do tempo. É tão antiga quanto a história da humanidade. O certo é que se originou da tábua de calcular, o mais antigo dos ábacos, diante da necessidade da humanidade de negociar.
Alguns dizem que o soroban ainda em estágio de ábaco, teve sua origem na Mesopotâmia. O que sabemos é que esta tábua de calcular passou por muitas mudanças até a sua configuração atual, evoluiu e sendo bastante utilizado pelos povos do oriente. A sua forma, tamanho, material e dispositivo, variou de acordo com os usuários, e hoje existem vários tipos de ábacos utilizados pelo mundo inteiro.
O ábaco pressupõe um estágio de civilização pós-nomádico, agrário e comercial, a existência de certo nível técnico e científico, uma burocracia de estado, e uma necessidade de calcular que colide com um sistema de algarismos inadequado ao cálculo por escrito e com a escassez de material conveniente para a escrita (suporte escritório). Isso explica a existência, real ou postulada, do ábaco, sob variadas formas, em diferentes povos e civilizações. No caso da China (e do Japão), tanto os algarismos tradicionais (ideogramas, seja na forma comum ou na solene, que são ao mesmo tempo números e palavras) quanto as formas usadas pelos comerciantes (baseadas nos bastões de cálculo) dificultavam o fazer contas por escrito, de modo que nos tempos anteriores à introdução dos algarismos arábicos e aos instrumentos mecânicos de cálculo oriundos do ocidente (máquinas de somar, calculadoras elétricas e eletrônicas, réguas de cálculo, etc) os ábacos eram indispensáveis para contar.
Os ábacos mais antigos que se conservam são os de contas soltas, gregos (ἄβαξ, ἀβάκιoν), de pedra, dentre os quais o mais conhecido é o ábaco de Salamina (referência epigráfica: IG II2 2777), descoberto na ilha de Salamina por volta de 1846, descrito em 1846 por Alexandros Rizos Rangabé (1810-92), que viu nele um tabuleiro de jogos, e discutido por Letronne e Vincent, que o identificaram como ábaco, concedendo que se pudesse usar como tabuleiro de jogos (in Revue Archéologique, année III, Paris, A. Leleux, 1846, 294-304; 305-308; 401-405). Ainda no âmbito helênico (Magna Grécia), merece menção o chamado Vaso de Dario, descoberto numa tumba datada do século III a.C. em Canosa (Kanusion, Canusium), Itália, em 1851. Exposta hoje no Museo Archeologico Nazionale di Napoli, essa grande peça de cerâmica (130 cm) representa na parte inferior, entre numerosas figuras históricas e mitológicas, um tesoureiro ou coletor de impostos calculando com um ábaco de contas soltas (uma mesinha adaptada) enquanto consulta um díptico de tábuas enceradas (tabellae ceratae); o ábaco mostra a quantia de 1231 dracmas e 4 óbolos. Um calculador exatamente na mesma posição que o coletor de tributos no Vaso de Dario aparece num camafeu, selo ou gema entalhada de procedência etrusca ou romana, no Cabinet des Médailles de la Bibliothèque Nationale (Gabinete das Medalhas da Biblioteca Nacional), Paris; a tábua encerada na sua mão esquerda mostra os sinais para as unidades, dezenas, centenas e milhares, enquanto com a direita ele põe os cálculos sobre o ábaco-mesa.
Da Roma antiga, não obstante a literatura clássica conter dezenas de alusões ao ábaco (abacus, tabula, tabella) e às contas (calculi, aera), não se descobriram até agora ábacos de contas soltas como os gregos, mas tão só representações mais ou menos controversas, das quais a mais clara é a que consta num relevo funerário do século II d.C. que está no Museo Capitolino, em Roma. Apelidado por arqueólogos de “Testamentum” (O Testamento), interpreta-se tradicionalmente como uma cena em que um homem dita instruções à esposa, sentada à direita, enquanto outro homem (talvez um escravo), à esquerda, faz contas num ábaco, provavelmente calculando a distribuição dos bens para que a soma dos quinhões não exceda o patrimônio total. Para Eve d’Ambra (“Mourning and the Making of Ancestors in the Testamentum Relief”, in American Journal of Archaeology, Vol. 99, No. 4 (Oct., 1995), pp. 667-681), o relevo representa o falecido como um jovem na flor da idade, reclinado num tipo de divã (uma kline grega), segurando um rolo de papiro com uma mão, a qual repousa sobre o joelho da matrona sentada ao seu lado numa cadeira, os pés sobre um escabelo; a matrona, com véu na cabeça a indicar luto, abraça o filho, que olha em sua direção; um retrato em escudo (clipeata imago) representando provavelmente o falecido pai do rapaz e marido da matrona localiza-se acima e atrás do falecido. Um pequeno escravo, em pé, posta-se à esquerda do relevo. Com base em comparações com outras obras e na análise dos penteados, roupas e outros elementos, a especialista sustenta que o relevo data da época de Trajano, representa uma família de libertos (ex-escravos) e, em vez de documentar a transmissão de patrimônio na família (testamentos eram lavrados em tábuas enceradas, não em rolos de papiros, os quais eram o formato tradicional do livro, símbolo usado para denotar a cultura do portador), indica antes o cumprimento do dever de cultuar os falecidos, comemorando-os com obras de arte que os transformavam em antepassados de uma linhagem. O escravo com ábaco figura no relevo provavelmente para mostrar que a família enriquecera a ponto de precisar de um guarda-livros e que teria sido libertado com a morte do jovem. Quanto a instrumentos reais do mundo romano, restam somente três ábacos portáteis metálicos autênticos (um na França e dois na Itália) e descrições (ou menções) de outros dois (ou três) em autores dos séculos XVI e XVII (Fulvio Orsini, Antonio Agustín Albanell, Pedro Chacón, Lorenzo Pignoria (ou Pignorio), Marcus Welser, Jan Gruter, Johann Jacob Hofmann).
Segundo Francis Pierrepont Barnard (The Casting-Counter and the Counting Board, Oxford, Clarendon Press, 1916), na Europa ocidental, entre 1200 e 1600, usavam-se peças monetiformes sobre tabuleiros, mesas ou balcões com linhas riscadas, pintadas, entalhadas ou incrustadas para se fazer contas. Na Inglaterra, França e Alemanha também se usavam toalhas riscadas ou bordadas com linhas (carpets for the counter, bure, Rechentuch). O nome dessas peças era jeton, jetoir, jettouer, méreau à compte (francês), jetton, (casting-)counter (inglês), Rechenpfennig, Reckenpfening, Raidtpfening, Raidtgroschen (alemão), worpghelt, rekenghelde, rekenpenning, legpenning (flamengo/neerlandês), contador, gitón, cálculo (espanhol), jactus, projectile, denarius, nummus, numisma, calculus (latim medieval e neolatim), "contos pera contar", tentos de contar, moedas de conto (português). O seu uso é documentado na Casa Real de França desde o século XIII, donde se espalhou para a burocracia e para o povo em geral, e em seguida para o estrangeiro. Vários autores publicaram métodos de aritmética com moedas de conto ao longo dos séculos XVI e XVII: Robert Recorde, John Awdeley, Gregorius Reisch, Johannes Cusanus, Joannes Martinus Siliceus, Jacob Köbel, Juan Perez de Moya, Jan Trenchant, François Legendre, Adam Ries, Jehan Adam, Johann Albrecht, etc. Com a adoção paulatina dos algarismos arábicos, esse gênero de aritmética instrumental entrou em lenta agonia. França e Alemanha conservaram esse tipo de ábaco até o fim do século XVIII. A Rússia medieval também teve um método próprio algo semelhante, talvez autóctone, antes do aparecimento do stchoty.
Na Índia, segundo R. Venkachalam Iyer, “pandits” (eruditos versados nos Vedas, em direito hindu, filosofia e ciência) ortodoxos usavam até recentemente, para realizar as quatro operações, um conjunto de conchinhas chamadas “rāsi” (Cypraea moneta, o cauri), semelhantes aos “búzios” de adivinhação no Brasil, das quais uma centena de alongadas (anka rāsi) para representar os números de 1 a 9, e uma dúzia de arredondadas (sūnya rāsi) para representar a ausência de número numa posição (o zero); manipuladas sobre um tabuleiro, um assoalho liso ou qualquer superfície plana, eram agrupadas em tríades (em caso de números maiores que 3) para facilitar a visualização (The Hindu abacus, in Scripta Mathematica, vol. 20, 1954, pp. 58-63). Gilles Tarabout refere ter visto um astrólogo de Kerala, na Índia, fazer cálculos astronômicos e astrológicos manipulando com destreza espantosa cauris (108 deles formam um conjunto) em lugar de usar uma calculadora, e julga ser habilidade rara atualmente (Authoritative statements in Kerala Temple Astrology, in Rivista di Studi Sudasiatici, 11, 2007, pp. 85-120).
Nas Filipinas, o tabuleiro sungka (conhecido também sob o nome de mancala), hoje usado para jogos e ocasionalmente para adivinhações, servia para cálculos matemáticos com cauris ou com quaisquer objetos miúdos, como sementes de tamarindo ou seixos, depositados nele. Trata-se de um tabuleiro retangular disposto horizontalmente, com duas fileiras de sete cavidades cada uma, e mais duas cavidades, uma em cada extremo (MANANSALA, Paul. Sungka Mathematics of the Philippines, in Indian Journal of History of Science, 30 (1), 1995, pp. 13-29).
Os modelos de contas enfiadas em hastes fixadas em caixilho ou bastidor não são muito antigos. Na Rússia há o stchoty (счёты; séc. XVII), cujo uso vem rareando desde a década de 1970, e que, levado à França por Jean Victor Poncelet em 1814, originou o ábaco escolar de 10 contas por haste (cidade de Metz, entre 1814 e 1840), segundo Irina e Dmitri Gouzévitch (La Guerre, la Captivité et les Mathématiques, in Bulletin de la Société des Amis de la Bibliothèque de l'École Polytechnique, 19, jun.1988, p.62); o stchoty foi também levado, possivelmente através da Turquia, à Pérsia (atual Irã), onde até recentemente era usado sob o nome de chortkeh (pron.: tchortkêh). Na China, o “suàn pán” (ou “suan p’an”, tábua ou bandeja de calcular, também chamado literariamente de “chou pan”) teria surgido entre 1280 e 1380, suplantando rapidamente varetas e blocos de cálculo. Na Coreia é usado o "tchu pan", um ábaco praticamente idêntico ao japonês. No Vietnam, o "ban tuan" ou "ban tien". E no Japão, o ábaco recebeu nome e características especiais: Soroban.
O ábaco chegou ao Japão provindo da China (talvez por intermédio da Coréia), onde se chama suan pan. Considera-se que o estudioso de suan pan que o transformou em soroban teria sido o professor Kanbei Mōri (também conhecido como Shigeyoshi Mōri, 毛利重能 Mōri Shigeyoshi), no ano de 1622, tendo tido vários adeptos em Kyoto, a antiga capital do Japão. O soroban apresentava então o seguinte aspecto: duas contas na porção superior e cinco na inferior, possibilitando registrar valores de “0” a “15” em cada coluna. Esta configuração se deveria a, entre outros fatores: a) o sistema de pesos e medidas em uso na China de então (16 taéis, i.e. onças chinesas, ou "liăng" (jap. ryō), 兩, perfaziam um cate, i.e. libra chinesa, ou "jīn" (jap. kin), 斤, cerca de 600 gramas); b) um dos métodos chineses de multiplicação; c) o método chinês mais comum de divisão no suan pan, baseado numa tabuada especial.
A primeira transformação ocorreu ainda na época do Japão feudal, mas somente no desenho das contas: a forma destas, ao ganhar aresta central, passou de arredondada a rombóide (vista em corte transversal). Na era Meiji (1868-1912) houve a segunda adaptação feita no Japão, que foi a retirada de uma das contas superiores. Ainda assim, podia-se representar de “0” a “10” em cada ordem, totalizando 11 possíveis valores.
A terceira e última transformação aconteceu por volta de 1930. Como o Japão utilizava o sistema decimal, apesar da diferença de ordens por classe (unidades, dezenas, centenas, milhares, miríadas, na contagem sino-japonesa), foi natural a retirada da quinta conta unitária, o que originou o soroban moderno. Este ainda é referido como novidade em 1933. Quando em 1935 se revisaram os manuais escolares japoneses, o soroban 1+4 tornou-se o padrão e o seu uso alastrou-se no Japão.
Este é o soroban que predomina até os nossos dias, podendo-se hoje encontrar modelos para utilização tanto por pessoas dotadas de visão como por deficientes visuais, pois de acordo com a necessidade variam os tipos. Seu processo de evolução, tornando-o um instrumento cada vez mais preciso e de fácil manejo, acompanhado de seu uso intensivo nas escolas, evidenciou aos professores japoneses um fenômeno singular: o desenvolvimento, em alguns abacistas, de uma capacidade de efetuar cálculos mentais apenas com manipular as contas de um soroban imaginário. Tal capacidade, batizada de anzan (暗算, cálculo mental; literalmente “cálculo no escuro”), é hoje um dos objetivos do aprendizado do soroban. Estudo conduzido por Giyoo Hatano (Universidade de Dokkyo) e Keiko Osawa (Universidade de Tóquio) (Digit memory of grand experts in abacus-derived mental calculation, in Cognition, 15 (1983), 95-110) demonstrou que abacistas exímios em anzan são capazes de reter na memória por no mínimo 30 segundos imagens de números de 5 a 9 algarismos representados no soroban e reproduzi-los de trás para diante. E Kimiko Kawano (PhD), pesquisadora do Centro de Informática e Ciências da Escola de Medicina do Japão (Nippon Medical School, Nippon Ika Daigaku, 日本医科大学), apurou mediante electroencefalografia (EEG) que praticantes de anzan calculam com o hemisfério cerebral direito, ao passo que pessoas comuns usam o esquerdo, por causa da visualização do soroban imaginário. Abacistas exímios usam esse poder de visualização para memorizar, por exemplo, páginas inteiras de livros.
Podemos dizer que o ábaco é o pai dos atuais e modernos computadores. A Pascalina, como foi apelidada a primeira calculadora mecânica, foi criada por Pascal, inspirada nos movimentos do ábaco, em 1642. O modelo desenvolvido consistia numa caixa contendo rodas dentadas e engrenagens, que conforme se encaixavam produziam os cálculos visados.